Novo mestrado em Macau vai ensinar patuá, crioulo português perto da extinção

O patuá, crioulo português de Macau, vai ser “estudado e falado” no futuro mestrado em estudos lusófonos da Universidade de São José (USJ), numa tentativa de preservar esta língua a um passo da extinção, disse um dos coordenadores.

“Tanto quanto sei, é o primeiro curso oficial com este conteúdo. É uma primeira tentativa, ao nível da pós-graduação, de estudar, falar e tratar do maquista”, explicou Alan Baxter, um dos coordenadores do novo mestrado da USJ, em entrevista à agência Lusa.

O especialista em crioulos de base portuguesa, que regressou a Macau em 2016 para dirigir a Faculdade de Humanidades daquela universidade, assumiu preferir o termo maquista, já que este “radica a língua dentro de uma tradição local”.

Para Alan Baxter, “o patuá merece um lugar oficial e de reconhecimento na educação superior”. Assim, esta língua, em tempos corrente na comunidade macaense, é um dos nove módulos da especialização em linguística do novo mestrado da USJ, mas é também opcional para os que optam pela outra especialização, literatura.

Derivado do crioulo de Malaca, o kristang, uma “língua ainda viva”, o patuá não sobreviveu a “atitudes ignorantes e colonialistas”, tendo “sido suprimido” com o passar dos anos, referiu Baxter.

Há quase uma década, a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) classificou-o como “gravemente ameaçado”, o último patamar antes de uma língua se extinguir por completo.

Uma posição que tem vindo a ser reiterada por vários linguistas. Em setembro passado, também o investigador da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Hugo Cardoso tinha dito, em entrevista à Lusa, que esta “fase avançada de declínio” motivou, entre a comunidade macaense, “um movimento de reapropriação da língua”.

Assim, e apesar do perigo de extinção, Alan Baxter afirmou que houve, desde então, “alguns avanços”.

“Há mais interesse agora do que havia. Há um interesse visível, sobretudo em termos demográficos”, frisou o antigo diretor do Departamento de Português da Universidade de Macau (2007–2011).

Atualmente, o patuá é preservado essencialmente através do grupo de teatro Dóci Papiaçam di Macau, que encena uma peça por ano maioritariamente falada em crioulo. A próxima está em cena nos próximos dias 18 e 19.

Para o especialista, o “grupo de pessoas envolvidas no teatro” nos últimos anos é um dos exemplos dessas “mudanças de atitude”.

O novo mestrado da USJ foi aprovado no mês passado pelo Governo de Macau e as candidaturas já estão abertas.

Quanto ao público-alvo, Baxter sublinhou que o objetivo é “fomentar o interesse da comunidade macaense”, mas também “de outras pessoas”.

Em 2017, o curso que lecionou na USJ sobre patuá, teve uma adesão surpreendente: houve um manifesto “interesse da parte da comunidade chinesa”, recordou.

“Há dois anos ofereci um curso de extensão sobre o patuá, e apanhei um susto porque houve muito interesse. Acho que tivemos 22 pessoas que chegaram a fazer o curso”, acrescentou.

Apesar destes esforços, Alan Baxter realçou a importância da documentação, isto é, de “elaborar materiais interativos audiovisuais”.

“Na verdade, há poucas pessoas capazes de manter uma conversa nesta língua hoje em dia, infelizmente. Esse tipo de material é fundamental”, sustentou.

Em contrapartida, a gramática do kristang, que ainda “é uma língua viva e falada”, é “muito parecida” com a do patuá, por isso, todos os interessados podem aprender muito com o crioulo de Malaca, defendeu.

Baxter deixou uma sugestão: “Se há um grupo de jovens interessados, é possível, colaborando com a comunidade de Malaca, enviar um grupo para lá”.

“A pronúncia é diferente, mas a gramática e o léxico” são semelhantes, “daria para fazer a transição e ganhar um grau de influência que não é possível conseguir em Macau”, concluiu.

Fonte: Lusa

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