Operário convertido em inventor ilustra vontade da China em voar mais alto

De operário fabril a inventor de uma ‘scooter’ voadora, Zhao Deli sabe que a resiliência é a chave do sucesso, sintetizando na sua história de vida a espetacular transformação da China numa potência industrial.

“Os outros percebem a teoria, mas eu cheguei lá através da experimentação”, descreve à agência Lusa o criador de uma mota voadora, capaz de atingir 70 quilómetros por hora e cem metros de altitude.

“No total, realizei 1.500 voos teste e fui assim aperfeiçoando a máquina: passo a passo”, conta Zhao, de 41 anos.

Em entrevista à agência Lusa, na sua oficina em Dongguan, cidade industrial situada no coração da província de Guangdong, Zhao ri-se ao mostrar uma das suas quedas, registada em vídeo.

O tombo, de uma altura de dois metros, resultou numa perna partida, mas tratou-se apenas de mais um percalço no longo caminho percorrido pelo inventor, até cumprir o “sonho de miúdo”.

Nascido em Hunan, província empobrecida do centro da China, Zhao Deli rumou a Dongguan após completar o ensino médio, em 1998, parte de um fluxo de milhões de trabalhadores do interior, à medida que Guangdong se convertia na fábrica do mundo.

O seu primeiro emprego foi numa linha de montagem de tacos de golfe. Seguiram-se muitos outros – desde porteiro a vendedor de seguros -, até que abriu um restaurante de comida típica da sua terra-natal.

Mas o encontro casual com um grupo de entusiastas que voavam pequenos helicópteros por controlo remoto despertou em Zhao memórias do seu ídolo de infância: o Rei Macaco, lenda chinesa que inspirou a série de animação Dragon Ball.

“Voltei a sonhar”, diz. “Comprei então um helicóptero por controlo remoto, mas à primeira tentativa estatelei-o no chão”, lembra.

Na tentativa de recuperar o aparelho, Zhao leu livros, consultou fóruns e portais ‘online’, num processo de autoaprendizagem que lhe permitiu compreender os princípios da aeronáutica e fabricar o seu próprio helicóptero, movido a gasolina.

Em 2013, fundou uma empresa de design e venda de ‘drones’ (veículos aéreos não tripulado), que chegou e empregar vinte engenheiros e a faturar vinte milhões de yuan por ano (mais de 2,6 milhões de euros).

Mas, à medida que grandes grupos chineses se impunham no mercado, a empresa de Zhao foi perdendo quota, até entrar em falência, em 2016. “Tive que despedir os funcionários”, conta. “Fiquei apenas com um assistente, que mantenho até hoje”, acrescenta.

Endividado, e contra os conselhos de amigos e da mulher, para que voltasse à restauração, Zhao reergueu-se. “Enquanto tiver ideias e sonhos, irei definitivamente atrás deles”, assegura.

Num terreno baldio no Sul de Dongguan, o inventor acena, pairando a cerca de dez metros do solo, antes de voar rumo ao horizonte. Equipado com uniforme, capacete e protetores para os cotovelos e joelhos, segue até se reduzir a um ponto negro no céu cinzento.

A cem quilómetros dali, a cidade de Shenzhen sedia as principais firmas tecnológicas da China, incluindo o grupo de telecomunicações Huawei, a fabricante automóvel BYD ou o gigante da Internet Tencent.

Outrora uma vila pacata, Shenzhen serviu de laboratório à abertura da China à economia de mercado nos anos 1980. No ano passado, o Produto Interno Bruto da cidade ultrapassou os 338 mil milhões de dólares, à frente de Hong Kong ou Singapura.

Pequim espera agora que as principais cidades de Guangdong, incluindo Shenzhen e Dongguan, se aliem às regiões vizinhas de Hong Kong e Macau, para formar um ‘cluster’ de classe mundial, designado de Área da Grande Baía.

O objetivo é que esta grande metrópole, com cerca de 70 milhões de habitantes, impulsione a transformação do país numa potência tecnológica, com capacidades em setores de alto valor agregado, como inteligência artificial, robótica ou carros elétricos.

Zhao Deli está à procura de investidores para avançar com a produção em massa do seu aparelho. Ele defende a utilidade para operações de resgate, gestão de trânsito, entregas ao domicílio ou como solução de mobilidade.

“No início das reformas económicas, a China limitou-se a fabricar para grandes marcas mundiais, ficando com margens de lucro reduzidas e os danos ambientais”, descreve. “Chegou à altura de investirmos em pesquisa e desenvolvimento”, diz. “Queremos ser nós agora a inovar”, assegura.

Reportagem: Lusa

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