Amor, resistência e guerra em Moçambique no teatro de Mouawad que se estreia em Lisboa

 Uma peça sobre o amor e sobre como este é a chave para resistir a todos os contratempos é como o encenador Victor de Oliveira define “Incêndios”, que dirige, na sexta-feira e no sábado, no Grande Auditório da Culturgest, em Lisboa.

Uma peça sobre “o amor em tempos difíceis”, já que a ação atravessa o período da guerra da independência em Moçambique, baseada na obra homónima do autor, ator e encenador libanês-canadiano Wajdi Mouawad (1968), e que é representada, pela primeira vez, em Portugal.

Escrita por “um dos grandes autores europeus contemporâneos dos últimos 20 anos”, “Incêndios” conta a história de Nawal, uma jovem que acaba de morrer e que deixa um testamento aos seus filhos gémeos.

Além da história de Nawal, “Incêdios” conta também a história dos irmãos Joana e Simão que acabam por descobrir que o pai, que julgavam morto, está vivo, e que têm um irmão que desconheciam, referiu Victor de Oliveira à Lusa.

Os irmãos acabam, assim, por partir em busca de uma verdade que desconheciam ao mesmo tempo que buscam encontrar-se a si próprios num território devastado por uma guerra civil e ocupado por uma armada inimiga, disse.

A peça acaba também por ser o relato de uma resistência, ao mesmo tempo que segue em paralelo cada uma das três histórias que se ligam entre si, já que cada uma delas encontra a sua origem na outra, frisou o ator e encenador nascido em Moçambique, e residente em França há mais de 20 anos.

Por isso, a peça de Mouawad, que já viveu em França e no Canadá, e que há oito anos se radicou em França, é uma história sobre três destinos “que procuram a sua origem para tenta perceber a equação das suas resistências, dos seus traumas”, observou o encenador.

“E o que se está a contar vai para lá da ficção”, sublinhou, acrescentando que a peça se estreou em Maputo, em 09 de agosto último, “dois dias depois de a Frelimo e a Renamo terem assinado novos acordos de paz”.

A experiência e o olhar dos atores da peça – todos moçambicanos – sobre a guerra civil (de 1978 a 1992), que se confrontaram no seu país confere ainda um fator acrescido ao espetáculo.

Mas “Incêndios” – chamado assim porque em quase todas as peças do autor há um incêndio, segundo o encenador – é também uma peça sobre exílios e uma viagem sobre a busca de identidade.

A experiência não é alheia ao encenador, nascido em Moçambique, em 1971, e que, aos oito anos, se fixou em Portugal, com os pais, antes de se mudar para Paris, onde reside há mais de 20 anos.

A violação, a tortura, as crianças-soldado, que também existiram nos anos 1980, em Moçambique, são temas abordados em “Incêndios”, assim como o exílio, o desenraizamento e a perda de raízes, referiu Victor de Oliveira.

“Incêndios” está publicado em Portugal desde 2013, na coleção Livrinhos do Teatro, uma iniciativa conjunta dos Artistas Unidos e da editora Livros Cotovia, com o título “O sangue das promessas: Céus, Florestas, Litoral e Incêndios”.

“Incêndios” é, segundo Victor de Oliveira, o texto de Wadji Mouawad mais representado em teatro, pelo que não entende por que motivo ainda não tinha sido representado em Portugal.

Este espetáculo foi também a estreia do encenador em Maputo, uma experiência que lhe foi extremamente agradável já que nasceu em Moçambique e ainda tem grade parte da família no país.

Ainda que as suas recordações sejam “quase todas, de coisas, horríveis”, incluindo do “rumo marxista-leminista que Samora Machel deu, na altura, ao país”.

A peça é uma criação do encenador e dos artistas moçambicanos David Aguacheiro, Nandele Maguni e Caldino Perema, a partir da tradução de Manuela Torres.

Interpretam a peça Elliot Alex, Rita Couto, Horácio Guiamba, Bruno Huca, Ana Magaia, Alberto Magassela, Josefina Massango, Eunice Mandlate, Rogério Manjate e Sufaida Moiane.

O espetáculo pode ser visto na sexta-feira, às 21:00, e, no sábado, às 19:00.

A música é de Nandele Maguni, o vídeo, de David Aguacheiro, o desenho de luz, de Caldino Perema e, os figurios, de Isis Mbaga.

“Incêndios” é uma produção do Centro Cultural Franco-Moçambicano, com a Culturgest, Le Grand T — Théâtre de Loire-Atlantique (Nantes) e o Centre Dramatique National de l’Océan Indien (Ilha da Reunião).

Fonte: Lusa

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