Portugueses na Arte Macau 2023
Representação portuguesa no certame asiático, que decorre até 28 de outubro, está a cargo da Fundação Bienal de Arte de Cerveira.
A terceira edição da Arte Macau, Bienal Internacional de Arte de Macau, inaugurou no passado dia 28 de julho, com curadoria de Qiu Zhijie (CN, 1969) que sugere como tema geral da mostra “A Estatística da Fortuna”. Qiu Zhijie, artista visual, curador e professor na Academia Chinesa de Artes desde 2003, transporta para o evento algumas das preocupações da sua produção artística, focada na luta entre as forças do destino e a autoafirmação do indivíduo.
Considerando o contexto de Macau, território de jogo em que sorte e azar são parábolas do quotidiano, o reputado curador chinês, propõe uma reflexão sobre a relação entre ciência e religião. A Arte Macau 2023 apresenta oito polos de exposição e mais de 200 artistas, representativos de 21 países. Portugal, cujas identidades ainda são marca desta Região Administrativa Especial (ERA) chinesa, além do pavilhão, pela primeira vez, protagonizado pela Fundação Bienal de Arte de Cerveira, está representado por outros artistas, convidados para a exposição principal patente no Museu de Arte de Macau (MAM), que contrariam a imagem de um país ainda excessivamente focada no fado, no pastel de nata ou no galo de Barcelos.
Catarina Mil-Homens (PT, 1979) é uma dessas artistas convidadas por Qiu Zhijie. Licenciou-se em Pintura na Faculdade de Belas-Artes de Lisboa e concluiu o mestrado de investigação em artes visuais na Universidade de Melbourne, na Austrália, país onde residiu nos últimos anos, tendo regressado a Portugal muito recentemente. Com uma prática artística que abrange o desenho, a instalação e o vídeo, o trabalho da artista explora a relação entre corpo e mente, matéria e não-matéria. Não raras vezes o seu processo recorre à repetição de elementos, privilegiando os de natureza industrial, bem como a sua reutilização.
A obra “Nós também somos fantasmas”, propõe-nos uma autorreflexão sobre as camadas de que somos feitos, sobre o palimpsesto em que nos escrevemos como Seres Humanos, plenos de contrastes, de feitos e erros. Neste sentido, a artista assume as características próprias dos materiais que escolheu para esta obra (vidro e metal) e as contingências da viagem.
Fábio Colaço (PT, 1995), por sua vez, propõe aos públicos que se sintam como se estivessem numa capa da revista Fortune, com uma obra conceptual que faz uma leitura perfeita do que simboliza o jogo em Macau e o sonho chinês da riqueza. Merece ainda referência a participação de Carlos Marreiros (Macau, 1957), nascido já no oriente no período da administração portuguesa, descendente de um algarvio e de uma macaense e que tem a arquitetura como atividade principal, ainda que uma assinalável carreira como artista visual. Foi, inclusive, presidente do Instituto Cultural de Macau, uma espécie de Ministério da Cultura da RAE, o que prova a sua relevância para a dinâmica cultural de Macau e para o encontro de culturas que sempre procurou promover e que é apanágio deste evento maior. Uma última referência para Konstantin Bessmertny (RU, 1964), nascido em Blagoveschensk, cidade da então URSS e que, por volta de 1992 e depois da queda do Muro de Berlim, se fixa entre Hong Kong e Macau, ficando mesmo impedido de voltar à Rússia onde é, até aos dias de hoje, perseguido politicamente. Fala corretamente português e tem, atualmente, atelier e casa em Alcobaça. As obras que apresenta nesta bienal têm, precisamente, marcas semióticas a Lisboa e a outros lugares de Portugal, tendo a sua pintura, referenciais inequívocos nos formalismos renascentistas de artistas flamengos como Pieter Bruegel (NL, c.1525-1569) ou Hieronymus Bosch (NL, c.1450-1516) e uma estética satírica, reflexiva da sua história pessoal de luta pela liberdade.